Em conversa com um amigo lusitano, ele me contou a seguinte fábula: “existiam duas pessoas na estrada, cada uma com um pão debaixo do braço. Quando se encontram, cada uma deu seu pão para o outro e foram embora, cada um com um pão debaixo do braço. Outras duas pessoas, numa outra estrada, tinham cada uma, uma idéia na cabeça. Quando se encontraram, um contou para o outro sua idéia. Ao irem embora, cada uma tinha não mais uma idéia, mas sim duas na cabeça.”
A fábula é, sem dúvida, muito interessante. Ela mostra que a troca de conhecimento é mais rentável que a troca de bens, sejam estes de consumo ou não. Usando esta mesma fábula, podemos ter uma resposta próxima do porquê o software livre cresce com tanto vigor e velocidade. O compartilhamento de idéias é premissa básica dentro deste modelo, assim sendo, estas se multiplicam e crescem de forma exponencial, permitindo que todos possam tirar proveito dela e paralelamente, possam emergir ante os interesses de poucos.
Isso não ocorre com o modelo de software proprietário. Leis e “copyrights” engessaram a partilha do conhecimento humano, baseando-se única e exclusivamente no “ter” e não no “saber”. Ao contrário das idéias de Thomas Jefferson que imaginava o copyright como uma ferramenta para proteger o veículo e não a idéia, hoje este é usado como artifício de proteção dos interesses financeiros de meia dúzia daqueles que, como Rousseau disse “…cerca a terra e diz: é meu!”
Assim, quando vemos e ouvimos campanhas que apregoam às pessoas o título de “piratas”, estes se esquecem (por interesses e não por real esquecimento) das idéias defendidas por Jefferson e pelos seus colegas iluministas. Não se está defendendo o meio, mas sim cerceando o acesso à criação e tentando tirar proveito daquilo que realmente não lhes pertence.
Muitas vezes as pessoas me perguntam: “não poderiam os interesses comerciais, acabar com o modelo do software livre rapidamente?”. Um sonoro não é a resposta sempre ouvida. Não existem, por mais que se procure, formas de comprar o software livre. Isso acontece pelo simples fato de que não se estar tentando comprar algo como uma empresa ou um pedaço de pão; está tentando-se comprar idéias, pensamentos. Seria o mesmo que querer comprar o socialismo ou o capitalismo. Mas alguns ainda tentam argumentar dizendo: “mas vemos que empresas compram os produtos, que o software livre está sendo vendido!”. Sim, isso é verdade.
Vários softwares livres estão sendo comercializados e nada deve impedir esta operação mercantil. Vende-se o produto resultante do pensamento e serviços agregados ao pensamento e conhecimento, não a idéia ou o pensamento em sí. Este modelo se diferencia a partir do momento que existe uma opção de escolha daquele que está adquirindo o bem. Pode-se optar por aquele “comprado” ou aquele “gratuito”, sendo este outro ponto inexistente no modelo de software proprietário, onde ou compra-se ou compra-se; não existe segunda opção.
Esta é a grande diferença. Não existe uma “software livre S/A” ou uma “SL Inc.” que possa ser adquirida por alguma outra “S/A” ou “Inc.” Existe sim uma comunidade de cérebros pensantes que, ao menor sinal de tentativa do cerceamento de suas idéias, abre outras frentes para inclusive combater aqueles que desejam acorrentá-las ou deixá-las sob o julgo do resultado financeiro. Então, com o software livre, continuaremos ver o crescimento do intelecto sob a posse, sendo esta principalmente uma questão de colocar os “pingos nos is” ou, historicamente, fazer aquilo que Rousseau disse: “Defendei-vos de ouvir esse impostor… os frutos são de todos… e a terra não pertence a ninguém !”