Estou na estrada do Software Livre desde 2000. De lá para cá, nem sei mais quantos foram os eventos que participei. Realmente perdi a conta mas creio que passaram de 200 nestes onze anos de caminhos percorridos. De lugares suntuosos como assembléias legislativas e reuniões com ministros até bimboquinhas perdidas no meio do nada do Rio Grande do Norte ou ainda na Bolívia, sempre estive onde me chamaram com muita boa vontade e, muitas vezes, colocando do próprio bolso condições para estar presente.
Mas o Software Livre mudou, a comunidade mudou e eu também resolvi mudar. Então, a partir de 2012 não mais estarei presente em eventos que tenham cunho comercial ou que tenham patrocinadores de peso nos mesmos sem que seja pago para isso. Por quê? Explico:
Nos primórdios do software livre no Brasil, a coisa era preta. Era época de ouvir Steve Ballmer dando piti na web dizendo que o Software Livre era um câncer ou Maurício Ghetler, ex-CIO do Banco Santos (que não mais existe) berrando com meia dúzia de cabeludos dentro da Assembléia Legislativa de São Paulo. E nós, os que acreditavam na liberdade do código éramos considerados os “comunistas” da vez, aqueles que desejavam levar o país para um cenário parecido com a Coréia do Norte. Obviamente não pensávamos nisso, mas sim num futuro sem os grilhões que iriam prender o conhecimento da sociedade.
O tempo foi passando, as verdades sobre a real importância do software livre aparecendo e empresas que antes abominavam a idéia de liberar seus códigos sob licenças livres, se convertendo e percebendo que é possível fazer dinheiro com este modelo; bastava deixar de lado os antigos modelos de licenciamento de software por caixinha. Nesta esteira muitos vem ganhando muito dinheiro honesto fazendo coisas muito interessantes com o software livre. Exemplos vem desde a Red Hat até a Acquia e tantas outras aqui mesmo dentro do país.
Junto com isso, os eventos “de/para software livre” também mudaram. Muitos deixaram de ser simplesmente pequenas reuniões de adeptos do código livre para se tornarem verdadeiros acontecimentos épicos. Muitos deles com mais de mil participantes e recebendo a presença de ministros, deputados, senadores e até mesmo presidentes, tanto no Brasil quanto fora dele. Mais que isso, uma pequena parcela se tornaram verdadeiras máquinas de fazer dinheiro, como é o caso da OSCON (Open Source Conference) promovida pela O’Reilly fora do Brasil, a LinuxCon que roda todo o planeta (inclusive chegando no Brasil) e o FISL – Fórum Internacional de Software Livre. De outro lado, alguns continuam pequenos mas não distantes da essência do que é o software livre e infelizmente, estes ainda tem que penar e muito para conseguir um miserável patrocínio para bancar as necessidades básicas de organizar uma conferência.
Não tenho nada contra estes eventos, ao contrário. Acho que o networking realizado nos mesmos é proveitoso, tendo inclusive uma máxima sobre isso de que “o melhor é o corredor”. São nos corredores que acontecem as boas conversas, os reencontros com pessoas realmente interessadas em mudar alguma coisa e a troca de experiências e informações muitas vezes contadas ao pé do ouvido. Mas de acreditar que são bons eventos a servir de ponta de lança em alguns, existe uma enorme estrada separando os dois extremos.
Alguns meses atrás um amigo me convidou para palestrar num evento e humildemente me informou que eu precisava pagar minhas custas. Até aí, quase tudo bem pois o tema me interessava e poderia fazer algum networking. Entretanto ao ver a página do evento com o patrocínio da Microsoft e da Oracle, decidi não participar pois acho um absurdo dar palanque para duas empresas de peso com estas e não receber por isso. Convenhamos, eles podem pagar para que eu participe e também para que gaste meu tempo indo até lá para “enriquecer” o evento deles. Justo não? Pois eles não acharam justo e retornaram com a ladainha de que “é em prol do software livre”. Ora ora ora, pról de quem cara-pálida? Oracle e Microsoft? Me poupe!
Dizem que aqueles que conseguem traduzir conceitos complexos ou teorias acabadas (ou inacabadas) de forma que qualquer leigo entenda, é um artista. Se isso é verdade, posso me considerar um pois acredito que tenho esta facilidade (ou dom como alguns dizem). Faço palestras há mais de quinze anos e durante este tempo aprendi como facilitar o entendimento para quem não entende ou não sabe do que está sendo falado.
Então, por isso tudo, não mais participo. Quem quiser, que pague e até faço a doação do valor para uma ONG de Software Livre ou coisa similar, mas não quero mais ser usado, literalmente. Claro que alguns irei com prazer pois conheço as pessoas, o evento, os interesses por trás dos mesmos e principalmente me afino com os preceitos que lá estão sendo expostos. No restante, no way!
Se você está pensando em fazer um evento e me chamar, leia o exposto acima. Se seu evento tem este cunho comercial, mesmo que seja sobre sofrware livre, prepare a carteira ou simplesmente nem envie convite. Agora, se ainda é um evento realmente de software livre, entre em contato clicando aqui.
Excelente post Paulino. Caras como você eu acho injusto mesmo dar palestras de graça mesmo sendo de software livre. Com sua vivência na área e com sua facilidade de palestrar não vejo por que não pagarem por isso.
E como você disse são mais de 200 palestras tanto dentro e fora do Brasil.
Abs e sucesso!
Parabéns Paulino pelo post, pois é difícil ver alguém enxergando de forma clara “novo” modelo de negócio que o o software livre representa.
Estava cansado de ver pessoas tratando a questão com cunho quase que religioso ou político.