Meu capítulo na íntegra do livro Software Livre e Inclusão Digital editado pela Conrad Editora de São Paulo/SP
Está mais que provada a relação entre educação de uma nação e sua independência, seja esta política, tecnológica ou social. O bem-estar da população está intimamente ligado ao seu nível cultural, não dependendo da geografia do país, de sua cultura, religião, parque industrial ou forma de governo. Exemplos não faltam no mundo mas pouco cabe aqui desfilá-los. Isso não quer dizer que devemos esquecê-los. Devemos sim, usar este pensamento como forma de questionar o nosso sistema atual e o que podemos fazer por ele e com ele, tendo como finalidade a preparação de nosso povo para os grande desafios que estão sendo apresentados diariamente.
É sabido que as distâncias entre os rendimentos de profissionais com e sem educação são enormes. Para piorar este quadro, as profissões de base, aquelas fundadas em sua maioria no trabalho braçal, estão desaparecendo num ritmo frenético devido a automação de tarefas ou ainda pela busca de mão-de-obra mais barata em países como Tailândia, Índia, Sri-Lanka, etc. De forma contrária, profissões nascem a cada dia e centenas de milhares de vagas ficam sem ser preenchidas devido a falta de profissionais com aptidões para desempenhar estas novas funções, em sua maioria, relacionadas a tecnologia. Então o desemprego não é uma questão de oportunidade laboral, mas sim de capacitação profissional do indivíduo.
Assim, existem duas opções para nosso quadro político-educacional-econômico atual: ou tornamo-nos um país “educado”, que propicia a população o conhecimento tecnológico necessário a inclusão do cidadão na sociedade atual, ou iremos servir novamente, como já ocorrido, de proletários para outras nações.
Mesmo estando na constituição brasileira como um direito social, a educação em nosso país mantém a décadas a cultura de que é algo caro e pouco rentável. Este pensamento coligado a interesses externos que desejam manter a população sobre um cabresto de ignorância e alienação, faz com que tenhamos uma massa de analfabetos sociais. Indivíduos que desconhecem seus direitos, seus deveres, seus valores, que não se empregam e que não geram riquezas para a coletividade, para o país. Complementando, aqueles que possuem o privilégio de freqüentar a escola, são preparados com currículos arcaicos e deficientes, os quais pouco contribuem para que deixe de ser um analfabeto social e que possa enfrentar os novos desafios a serem apresentados nos anos vindouros.
A inclusão digital
Nunca se falou tanto sobre inclusão digital quanto agora. Também há muito não se fala da educação como fator determinante de mudanças como nos últimos anos. O tema começa a interessar todos e não exclusivamente educadores e profissionais ligados, de uma forma ou de outra, a educação. Acredita-se que este despertar acontece principalmente pela disponibilidade da informação, advinda da tecnologia e da facilidade de obtenção desta.
Quando se fala em inclusão digital imagina-se logo aqueles “sem teto” tecnológicos; pessoas que não dispõem de computadores em suas residências ou locais de trabalho. O correto a pensar sobre o tema são os cidadãos que estão às margens da revolução hoje apresentada, moldada em bits e informação. Pessoas que não possuem acesso seletivo ao conhecimento fartamente existente e disponível gratuitamente (ou quase) dentro da Internet e de outras mídias. Certo seria dizer que estas pessoas são “excluídos de seleção”.
Hoje existe uma quantidade imensurável de informação, seja esta útil ou não. Somos bombardeados todos os dias em todas as mídias possíveis com informações de todas as áreas do conhecimento. A cada dia, um novo planeta é descoberto, uma nova técnica agrícola, uma nova vacina, um novo ancestral. Guerras iniciam-se e terminam, rebeliões e revoluções acontecem, enfim, estamos ligados vinte e quatro horas por dia no que acontece a nossa volta.
Mas somente “estar ligado” é discutível. Precisamos criar uma seletividade tão grande quanto a massa de informação recebida senão nosso papel continuará ser de coadjuvante nos acontecimentos do planeta.
Este é um dos desafios da inclusão digital. Somente inserir o indivíduo no mar de informação é pouco diante dos desafios apresentados. É necessário, principalmente, prepará-lo para ser seletivo e ter possibilidade de tirar o melhor proveito possível daquilo que recebe. Isto demanda muito mais que um computador ou uma conexão com qualquer provedor de informações, seja este a Internet ou até mesmo a televisão. Demanda a mudança de paradigmas na educação hoje existente e oferecida a todos nós brasileiros.
Voltando ao tema trabalho, em um estudo apresentado pelo Ph.d David D. Thornburg intitulado “2020 visões para o futuro da educação”, comenta-se que na virada do século (já passado), 60% dos empregos existentes vão requerer habilidades dominadas por somente 20% da mão-de-obra existente. Este fenômeno existe devido as necessidades específicas de proficiência em tecnologia e principalmente porque a educação não está preparada para abraçar as novas cadeiras de conhecimento que nasceram nas últimas décadas, tão velozmente quanto a lei de Moore.
Um quadro por demais estarrecedor. De um lado o grande número de vagas a serem preenchidas sem sucesso e, de outro, uma grande massa de pessoas necessitadas que não podem se candidatar a estas vagas devido a falta de instrução para conduzir determinadas tarefas, em sua maioria, relacionadas aos bits.
Então a inclusão digital como apresentada é errônea? utópica? De forma nenhuma. É preciso pensar nas várias opções existentes, nos vários caminhos, com a finalidade de fornecer aos cidadãos aptidões que atendam novas necessidades, não somente de educação mas principalmente de trabalho.
O software livre como ferramenta de inclusão
Paralelamente ao nascimento da Internet, ocorreu o verdadeiro debute do software livre. Puristas podem questionar esta informação afirmando que as idéias iniciais nasceram em meados da década de 80 com a criação da FSF – Free Software Foundation, dirigida por Richard Stallman, um ativista da idéia do software livre em todo o mundo. Mas sem a existência da Internet imagina-se que este não seria tão conhecido com é hoje e não teria 1% da sua força atual, gerada principalmente pela criação do sistema operacional Linux.
Além de politicamente correto, pois permite seu uso e distribuição sem a necessidade de licença ou autorização, o software livre traz no bojo três interessantes características; a condição de instigar o conhecimento do indivíduo baseado na necessidade daquele que o usa de “pensar” e não somente “apertar”, a redução de custos em níveis baixíssimos, facilitando assim a adoção do mesmo em comunidades que nunca poderiam pensar em ter uma ferramenta de qualidade e finalmente, a mais interessante das características, o senso de comunidade propiciado. Aquilo que é desenvolvido isoladamente ou em grupo, deve ser distribuído à toda a comunidade para que esta possa aproveitar o conhecimento adquirido. Isto faz com que o cidadão sinta-se parte de um conjunto e não somente coadjuvante de uma grande peça regida por duas ou três empresas.
Todas estas características vem de encontro com as necessidades de nações como a nossa que conhecem a urgência da inclusão do cidadão na revolução digital, que possuem um senso forte de coletividade mas não dispõem de recursos abundantes.
A educação e o software livre
Sabendo-se que uma das poucas formas (ou a única) de crescimento real do cidadão é a educação, pode-se usar o software livre com um papel fundamental neste processo, propiciando vários facilitadores para que todos sejam incluídos no cenário educacional e profissional atual e futuro.
O grande desafio é saber usá-lo. Iniciativas devem existir por parte de todos com a finalidade principal de modificar as atuais grades curriculares, dando-as mecanismos flexíveis para a adoção de novas tecnologias como o software livre e suas disciplinas correlatas. Sem esta premissa, pouco se pode fazer para aproveitar todo o potencial dele e cairemos no status-quo da educação de uma geração de “apertadores de teclas”.
O software livre, por suas características, é muito mais que isso. Ele deve ser explorado a fim de apresentar como as coisas ocorrem e não somente como programar para que ocorram. Isto não é referido somente a questão técnica, mas também a questão social, onde cada um aprende a contribuir para o coletivo, mediante suas descobertas, seu aprendizado, seus erros, seus acertos. Forma-se profissionais com aptidões e também caráter.
Muitos queixam-se ou usam como argumento as dificuldades de aprendizado para a não-adoção do software livre. É o mesmo que usar como argumento uma pessoa não guiar no Reino Unido, pois a localização dos pedais e das mãos de direção são diferentes da nossa. Resumindo, um argumento casto e pouco válido para algo tão grandioso. Dificuldades existem para todos e em tudo. A real diferença é enfrentá-las e passar adiante. Até mesmo neste ponto o software livre leva vantagem: ensina que desafios existem para que possam ser superados.
O que pode ser feito
Existem várias ações que podem ser adotadas para a união coesa da educação com o software livre que proporcionem a todos o avanço esperado. Dentre elas, principalmente a mudança imediata nas formas de avaliar e aplicar conhecimentos de estudantes em todos os níveis e a colaboração de vários segmentos da sociedade, norteados a criar pensadores e não braçais.
O primeiro ponto é de suma importância para dar aos educadores condições de incluir novas disciplinas e conhecimentos nos atuais currículos. Precisa-se mudar o que existe internamente numa velocidade maior do apresentado externamente. Preparar o estudante de hoje para trabalhar com tecnologias ultrapassadas é jogar pela janela não somente recursos, mas um tempo precioso que poderia ser usado com outra finalidade. Como disse Jack Welch “se a taxa de mudanças dentro de uma instituição for menor do que a taxa das ocorridas fora da mesma, o fim está a vista”.
O segundo ponto contempla todos os níveis e áreas da sociedade. É preciso que prefeituras absorvam e reconheçam a necessidade de proporcionar o conhecimento à todos, que companhias telefônicas disponibilizem acesso à Internet e outros provedores de informação, que produtores de hardware forneçam equipamentos subsidiados e que a comunidade de software livre participe ativamente de todo o processo, auxiliando na implementação e disponibilização de conteúdo e conhecimento a todos que necessitarem.
Exemplo dessas ações são os denominados Telecentros de São Paulo/SP. Locais espalhados pela cidade, muitas vezes em regiões pobres, onde o cidadão comum tem contato com computadores conectados à Internet e baseados em software livre, que podem ser usados para a obtenção de informação e conhecimento, sendo ciceroneado por pessoas ou monitores que explicam e auxiliam em todos os passos. De longe é um projeto faraônico ou engessado. Conta com a dinâmica do software livre, com o apoio irrestrito da prefeitura e com o interesse despertado nos usuários para ir adiante em suas descobertas.
Também deve-se destacar outra iniciativa. A Rede Escolar Livre, do governo do Rio Grande do Sul. Baseada totalmente em software livre, ela permite que estudantes, educadores, professores, funcionários e todos aqueles ligados a educação tenham acesso ao mundo da tecnologia e da informação digital, em qualquer parte, a qualquer tempo. Como exemplo de integração de vários segmentos, esta iniciativa conta com o apoio da companhia telefônica estadual que fornece canais de conexão para as escolas e várias empresas do segmento de hardware que doaram equipamentos para que o projeto fosse levado adiante.
Além destas, espalham-se por todo o país, iniciativas educacionais de utilização do software livre como ferramenta principal para oferecer conhecimento a centenas de pessoas. Faculdades, colégios de ensino médio e básico, prefeituras, ONG’s e outras empresas e instituições aprovam e utilizam-o nas mais diversas aplicações, oferecendo assim o conhecimento necessário hoje para a inclusão digital do indivíduo amanhã.
Conclusões
Lembrando-me de um adesivo no carro de minha mãe (professora) que dizia: “sem professor o país pára”, vou mais além. Sem educação atualizada e voltada a revolução da informação e do conhecimento, a sociedade e todo nosso país para. Não somente de professores e alunos se faz a educação, mas também de métodos e aproveitamento de oportunidades. Nunca em toda nossa existência foi tão fácil obter informação. Em contrapartida, nunca foi tão difícil fazer com que milhares de pessoas compartilhem a informação e os dividendos dela. É preciso rapidamente aproveitar o desejo de mudanças de nosso povo para educarmos a todos em tecnologia. Desta forma poderemos dar as gerações futuras condições de reconhecerem aquilo que é bom e aquilo que não é para si mesmos e formas de participar na sociedade, não somente como um gerador de impostos, mas principalmente como um crítico construtivo de nosso país. Para isso, o software livre é, sem sombra de dúvidas, a pavimentação da estrada que nos levará a atingir este objetivo muito em breve.
Amei mas naun te nada
q eu precisoo mas e bom continue assim..
Bjos
Muito bom, porem, indica bem o problema, mas, falha na indicação de soluções, Deixa, me parece, a critério de vontade plítica,no que não acredito. Perde a oportunidade de estimular a organização da sociedade para melhorar a vida das pessoas. Obrigado!